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Como será o primeiro casamento católico naturista do Brasil

4 de maio de 2019

Em vez de vestidos longos, paletó e gravata, sapatos recém-engraxados e toda a pompa tradicional, apenas uma canga – utilizada na hora de se sentar. Os noivos também estarão bem à vontade: nada de cauda longa, nada de fraque; vão dizer o “sim” completamente nus. Vestido mesmo deve comparecer apenas o padre, que, mesmo sendo adepto do naturismo, estará paramentado com batina e estola, como manda o figurino.

Está marcado para o próximo dia 25, em um sítio no município de Igaratá, região de São José dos Campos, interior de São Paulo, o primeiro casamento naturista católico pelo Brasil. Oficializam a união a pedagoga Gislaine Serafim Rodrigues, de 35 anos, e o advogado Douglas Abril Herrera, de 55 anos. Ambos são praticantes do naturismo já há bastante tempo e o matrimônio acontecerá em evento organizado pelo grupo Nós Naturistas – que congrega adeptos do naturismo e dissemina valores dessa filosofia de vida.

Em conversa com a BBC News Brasil, a noiva conta que a decisão de fazer uma cerimônia assim foi, como a própria filosofia de vida da qual é adepta: natural.

“Moramos juntos já faz um bom tempo e decidimos regularizar nossa situação perante a sociedade”, relata. “De início, só queríamos nos casar no civil e com os familiares mais próximos. Mas percebemos que a maioria dos nossos amigos é naturista. Então por que não celebrar uma data importante com as pessoas que gostamos, com um estilo de vida que também nos encanta?”

Rodrigues garante que “a cerimônia será como a convencional”. “O diferencial é que todos estarão sem aquelas roupas de festa e utilizarão uma canga para se sentar”, explica ela. Ou seja, tudo conforme a etiqueta da filosofia naturista, em que cangas são acessórios indispensáveis ao se sentar, por questões de higiene e respeito.

Decisão tomada, o casal esbarrou em um problema. Como conseguir um padre que topasse a empreitada? O problema nem é o naturismo em si – a Igreja Católica não é contrária à prática. “Não há posicionamento oficial sobre naturismo ou nudismo. Há, no entanto, cuidados propostos por moralistas quanto ao respeito e ao pudor diante da intimidade humana e sexual”, esclarece à BBC News Brasil o filósofo e teólogo Fernando Altemeyer Júnior, professor do Departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

O empecilho é quanto ao local. Salvo raríssimas exceções – como um quadro grave de saúde que impossibilite o deslocamento de noivos ou pais dos noivos -, a Igreja Católica Apostólica Romana não permite a celebração do sacramento do matrimônio em ambiente que não seja dentro de uma igreja. “Os padres [católicos apostólicos romanos] concedem apenas uma bênção fora da igreja e, para isso, teríamos de fazer todo o cerimonial na instituição religiosa também”, diz a noiva. “Por meio de um amigo, conhecemos o padre Daniel, que também é praticante [do naturismo] e foi bem receptivo à ideia.”

Assim, o matrimônio não será católico apostólico romano, mas sim católico ortodoxo americano. Padre Daniel Ferreira, de 60 anos, o celebrante, é membro desse clero desde 1992. Já foi pároco em Guarulhos, na Região Metropolitana de São Paulo. Atualmente, ocupa o cargo de chanceler da Igreja Católica Apostólica Reunida no Brasil, instituição considerada coirmã da americana.

Ferreira conta à BBC News Brasil que recebeu o convite para celebrar a união por meio de um amigo em comum com os noivos. “Também sou naturista e tenho plena consciência de que todos estão nus por baixo de qualquer vestimenta. Na cerimônia, estarei paramentado porque é o hábito que diferencia o monge – não ficaria bem um padre sem paramentos dando uma bênção, independentemente do objeto dessa benção”, diz ele.

Tanto o sacerdote quanto o grupo Nós Naturistas afirmam que se trata do primeiro casamento naturista celebrado por um padre no Brasil.

A cerimônia
 
Herrera frisa que o casamento será “exatamente igual a qualquer outro casamento religioso”. “O único diferencial é que todos estarão ao natural”, compara. “Todos os nossos amigos ficarão bem à vontade e nós também, não precisando se prender às ostentações do mundo moderno.”
 
Ele conta, entretanto, que tanto ele quanto a noiva deverão usar pequenos acessórios que os diferenciem dos demais na cerimônia. “Ambos deveremos se sentir à vontade”, afirma. “Aceitar o próprio corpo é algo que aprendi e tem me feito um bem enorme”, completa Rodrigues. “Como sou a noiva, vou usar alguns adereços que simbolizam o casamento, como o buquê e o véu – afinal, é nosso dia e nele podemos tudo.”

E a família, como fica? A noiva diz que todos sabem que eles são naturistas, mas, até o momento, nenhum familiar “manifestou interesse em participar de um encontro ao natural”. Como não são adeptos, “participarão apenas da cerimônia de união civil”.

Fonte: Por Edison Veiga, BBC